Por Douglas Ferreira com informações Veja
O direito constitucional dos partidos políticos à judicialização da política no Brasil tornou-se não apenas comum, mas quase onipresente. A maioria das propostas no Congresso Nacional e até mesmo as ações do Executivo frequentemente se desdobram em demandas perante a Suprema Corte.
Essa prática tornou-se tão frequente que os partidos acionaram o STF em mais de 800 ocasiões desde o ano de 2018. Curiosamente, a maioria dessas demandas é originada por partidos que se autodenominam de esquerda. A situação é tão absurda que já existe um projeto na Casa Legislativa propondo um limite para essas ações. Parece que a farra judicial pode estar prestes a encontrar seu limite. Uma reportagem da Revista Veja trouxe essa questão à discussão.
Saiba mais sobre o tema tratado por Veja:
O embate em torno da definição de um marco temporal para a demarcação de terras indígenas no ano passado foi, talvez, o maior conflito institucional travado. Após o STF reconhecer a inconstitucionalidade da tese, o Congresso aprovou um projeto de lei indo na direção oposta. O governo Lula vetou o PL, que foi posteriormente derrubado por 321 deputados e 53 senadores.
Logo após o presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD/MG), promulgar a lei no final de dezembro, cinco partidos governistas (PT, PSOL, Rede, PV e PCdoB) recorreram ao Supremo buscando sua anulação. Por outro lado, PL, PP e Republicanos entraram com uma ação para garantir que a decisão do Parlamento fosse preservada.
Atualmente, a posição do Legislativo sobre o tema é válida, mas tudo pode mudar após uma nova apreciação do STF
Apesar de o impasse em torno do marco temporal ser um exemplo ilustrativo, está longe de ser uma situação isolada. Um levantamento feito por VEJA revela que recorrer ao STF tornou-se uma prática previsível no jogo político – desde 2018, os partidos moveram nada menos que 807 ações de inconstitucionalidade para contestar leis aprovadas em plenário, anular decisões do Executivo e do Legislativo ou compelir governantes a agir em casos de suposta omissão.
De acordo com o Supremo, mais de 75% desses processos foram protocolados por partidos de esquerda após serem derrotados no Congresso ou terem seus pedidos negados pelo governo. Os campeões são PDT, PSB, Rede, PT e PSOL, todos da base governista.
As circunstâncias que motivaram essas ações variam, desde solicitações durante a pandemia para obrigar o governo de Jair Bolsonaro a comprar vacinas até exigências para o uso de câmeras corporais pelas Polícias Militares, enfrentando resistência de alguns Estados. Algumas buscam impor novas regras legais, como uma ação do PDT que pretende obrigar operadoras de TV por assinatura a incorporar canais abertos em seus catálogos.
Embora a esmagadora maioria dos pedidos venha de legendas de esquerda, é possível observar que a recorrência ao Judiciário tende a ser uma estratégia da oposição — o Novo, por exemplo, protocolou doze processos na Corte desde o início do terceiro mandato de Lula, superando as oito ações movidas pelo partido durante os quatro anos da gestão Bolsonaro.
A estratégia de recorrer ao STF pode estar prestes a sofrer um revés significativo. Uma ideia que ganha força nos bastidores da Câmara, apadrinhada pelo próprio Arthur Lira, é limitar o número de partidos que podem mover ações de inconstitucionalidade no Supremo.
O projeto de lei 3640/23, de autoria do deputado Marcos Pereira (Republicanos/SP), vice-presidente da Câmara, propõe uma espécie de “trava” com base na representação partidária, usando a cláusula de barreira como critério. A proposta, discutida com o ministro Gilmar Mendes, visa restringir o acesso ao Supremo somente às entidades com alcance nacional.
A limitação desse expediente pode representar uma mudança significativa na dinâmica política do país.