Por Betina Costa
“Venho fazer um convite a vocês: aproveitar a oportunidade deste tempo e explorar a possibilidade de crescer com as mudanças, aprender o novo, florescer e transformar a si mesmos e suas relações.”
Eis uma época do ano em que mais somos chamados à renovação, com a reflexão sobre metas, reestruturar planos, realizando balanços. Mais do que o período natalino e de ano novo, precisamos perceber que estamos vivenciando uma verdadeira mudança de era, novos paradigmas diante da intensa conectividade e interdependência global.
A velocidade das mudanças está exponencial diante da escalada da tecnologia, da inteligência artificial e da conectividade mundial, encurtando distâncias, aproximando culturas e acelerando processos. O que antes levava-se décadas para mudar, hoje a volatilidade e a impermanência de contextos impactam numa velocidade desconcertante, por vezes, angustiante.
Essa grande velocidade de interação social aumenta ainda mais as instabilidades sociais, políticas e econômicas, gerando um contexto complexo. Muitos reclamam, criticam, descortinando cenários caóticos. No entanto, é preciso ir além das críticas, é essencial refletir sobre esse contexto e como ele nos impacta, na vida e no futuro da nossa humanidade, do trabalho e das empresas. Pois, é a partir deste processo reflexivo que as soluções criativas surgem.
A realidade influencia a forma como pensamentos, sentimos e nos comportamos. Muitas vezes, vivenciamos a manipulação da realidade, que impacta de forma ainda mais considerável as relações e as reações da humanidade.
Que tempos são esses?! Tempos em que as mudanças se sobrepõem nessa velocidade surpreendente, desafiando nossa necessidade humana de controle e segurança. A insegurança gerada por este contexto é gatilho para muitos outros desgastes (além dos econômicos, sociais e políticos), ocasionando deteriorações emocionais, psíquicas, físicas, relacionais.
Os desafios enfrentados são os mesmos dentro do ambiente corporativo. Empresas são feitas de pessoas e suas relações. Parece óbvio falar isso, mas é preciso reforçar, pois há uma naturalização do automatismo e da super produtividade, como se fôssemos máquinas a gerar contínuos resultados.
A complexidade do cenário vem sendo objeto de estudos, análises de grandes pensadores, sendo descritos através de acrônimos como mundo VUCA e mundo BANI. VUCA é a sigla em inglês para as palavras: volátil, incerto, complexo e ambíguo; enquanto BANI traduz as ideias de fragilidade, ansiedade, não linear e incompreensível.
Até poucos anos atrás, nem estávamos familiarizados com este termo, mundo VUCA, que representa o período histórico pós-guerra fria, descrito de forma a explicar como o que acontecia no mundo impactava a vida das pessoas. Mas, um episódio descortinou um cenário de filme de ficção científica. Em março de 2020, tivemos a declaração oficial de pandemia pela ONU. A partir deste momento, este mundo incerto, complexo, volátil, e ambíguo, invadiu nossas casas e trabalhos, impactando todos globalmente.
Não obstante as inúmeras descrições do cenário atual, o fundamental é aprender a lidar com este quadro descrito, que nos causa, no início uma reação de incredulidade e negacionismo, diante dos sentimentos de impotência, medo e frustração. No entanto, os efeitos e impactos desses gatilhos de desconforto e incerteza dependem de como cada pessoa, organização, estado, empresa lida com essas adversidades. Cada um lida com problemas a partir do repertório de vida que possui, com crenças, culturas, experiências, inteligência emocional etc.
A transformação, então, depende do nosso desenvolvimento como seres humanos, da aprendizagem de competências e capacidades que nos tornem protagonistas das transformações, e não vítimas das crises. Nas empresas, não é diferente, são pessoas que determinam o sucesso ou insucesso do negócio diante desses complexos desafios.
É preciso, então, pensar fora da caixa, sair dos encaixes de velhos padrões para pensar coletivamente em soluções criativas e inovadoras, a partir das habilidades humanas. É preciso olhar de forma mais ampla para a realidade do que essas explicações lógicas (e ilógicas) do mundo. Racionalizar simplesmente sobre todos esses aspectos de imprevisibilidade, caos, insegurança, não trará as ações eficazes a transformar essa realidade.
Repito, de uma outra perspectiva: precisamos ampliar nossa percepção de forma a não apenas racionalizar, para compreender esse mundo para além dessas lentes racionais, analíticas e objetivas. Precisamos agregar o conhecimento do sentir, da subjetividade de cada indivíduo.
Pensar e sentir o mundo para percebê-lo com nossas sensações, sentimentos e como esta complexidade nos afeta. Essa compreensão irá definir como enfrentar esses desafios, desenvolver recursos pessoais (competências e habilidades) para tomar decisões conscientes e assertivas, a partir dos aprendizados a colher, errando e acertando, evoluindo.
Você, leitor, pode estar pensando: “Ah Betina, vamos sofrer diante de tudo isso. Se pararmos para sentir, o mar revolto das emoções vai invadir nossa mente. Vamos ficar mais ansiosos e nos sentiremos impotentes. Não dá para parar e sentir. Temos que calar as emoções e seguir em frente. Emoção é fraqueza.”
Esses são padrões de pensar e racionalizar a realidade que não nos trazem benefícios, e, muitas vezes, causam adoecimentos. São padrões que nos dizem a ser super-humanos, heróis, livres de emoção, máquinas de alta performance e resultados extraordinários. ‘Homens’ racionais.
Até que, uma hora, tudo o que pensamos que controlamos, implode e/ou explode, porque o problema foi empurrado para debaixo do tapete, foi negado, negligenciado. Ora, os cenários mundial, nacional, local, não estão sob nosso controle, a vida não é um movimento certo e previsível que podemos controlar. Devemos ter consciência disso.
Então, precisamos encarar o fato de que não somos somente animais racionais, somos humanos. E como humanos, não somente pensamos. Como humanos, pensamos e sentimos, percebemos este mundo e damos significados a tudo o que vemos.
Olhar para esse sentir não é fraqueza, é fortaleza. Somos seres racionais e emocionais.
Não há respostas certas para estes tempos incertos. Talvez haja respostas possíveis para as perguntas certas. Tenhamos compromisso em permanecer tentando achar as respostas simples para as perguntas mais difíceis, a partir do desenvolvimento de nossas capacidades humanas: pensar e sentir.
A resistência para as mudanças vem de uma guerra que não é externa, mas interna. O homem contra ele mesmo, contra seus instintos, sombras, defeitos, inércia. Precisamos querer autenticamente mudar para evoluir, com coragem, resiliência e constância. Assim, canalizamos a vontade de crescer, mantendo foco, encontrando aliados que queiram evoluir conosco, criando hábitos, reinventando nossa realidade.
Do lado de fora, as transformações acontecem independente de nosso querer. Do lado de dentro, prevalece o poder da decisão e do autorreconhecimento dos recursos internos para lidar com essas mudanças. Temos as capacidades biológicas para nos adaptarmos, desenvolvermos competências e fazermos o melhor para o enfrentamento necessário das adversidades, sem heroísmo, mas com protagonismo.