Move Notícias

Publicado em: 4 setembro 2023 às 11:49 | Atualizado em: 4 setembro 2023 às 19:24

América Latina pode ter “década achada”, diz presidente do BID, Ilan Goldfajn

Ilan Goldfajn comandou o Banco Central do Brasil de junho de 2016 a fevereiro de 2019 – Foto: Reprodução

O presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, Ilan Goldfajn, em uma entrevista exclusiva concedida ao jornalista do Poder360, Guilherme Waltenberg, em Nova Iorque, trouxe à tona uma análise crítica e otimista sobre o cenário econômico do Brasil e da América Latina.

Goldfajn destacou que o momento econômico atual é um dos melhores na história recente para o Brasil e a América Latina. Ele ressaltou a crescente demanda por produtos da região e enfatizou a oportunidade de pôr fim ao ciclo de “décadas perdidas” que assolaram a região. Para isso, o presidente do BID apontou alguns desafios cruciais a serem superados.

Ilan Goldfajn, com sua vasta experiência no cenário financeiro internacional, enfatizou a importância de uma resposta monetária eficaz no combate à inflação após a pandemia, mas também ressaltou a necessidade de uma política fiscal alinhada a essa estratégia. Para ele, a eficácia no combate à inflação depende da cooperação entre política monetária e fiscal.

Essa entrevista exclusiva, ao jornalista Guilherme Waltenberg, é um marco na cobertura jornalística, proporcionando insights valiosos sobre a economia brasileira e latino-americana. Além disso, demonstra a qualidade do jornalismo do Poder360 ao trazer uma entrevista tão relevante diretamente de uma figura-chave no cenário financeiro internacional, o presidente do BID, Ilan Goldfajn.

Questionado sobre a pregação do presidente do Senado que o Brasil faça um equilíbrio entre meio ambiente e exportação das riquezas naturais, como isso impacta as possibilidades de financiamento pelo BID e outros bancos multilareais, IIan Godfajn foi taxativo:


“Cada país tem sua soberania para decidir como fará sua transição energética. Alguns países como os da América Central, tem 80% da matriz renovável. Será mais rápido. Outros vão levar mais tempo. Tem Guiana, Suriname que estão na descoberta. Sob o ponto de vista dos recursos públicos, queremos apoiar a matriz limpa, que nos ajuda a chegar mais perto da meta de país. Vamos trabalhar com os projetos compatíveis”.


Godfajn entende por exemplo, que “Os organismos internacionais se adaptam às decisões do governo e usam os recursos públicos onde acham que tem que priorizar. Não é o caso de entrar na discussão local. Há soberania. Mas para usar os recursos, é no que achamos que tem prioridade, que é a transição energética. Vamos financiar energia limpa, hidrogênio verde”.

Mas o que o presidente do BID pensa sobre o etanol como energia limpa? “Teria que delegar para a minha área técnica para saber se esse especificamente é ou não é. Como presidente do BID, não tenho como saber cada detalhe”.

O jornalista Guilherme Waltenberg quis saber então sobre a questão fiscal e questionou: entramos em um momento mais fiscalista?


“É natural depois de gastos muito elevados como na pandemia. E isso tem que se consolidar. Está acontecendo no mundo todo. Gastou-se muito, a dívida subiu, tem que estabilizar. E fizeram certo. Tiveram que reagir. Agora, não dá para pensar que você está na pandemia todo ano. Tem choques. Sem falar que o combate à inflação é mais eficaz com uma política fiscal na mesma direção”, respondeu.


Waltemberg quis saber se o Brasil demorou em elevar os juros. A resposta foi: “Na América Latina, os presidentes dos bancos centrais reagiram antes e estão saindo antes do resto do mundo (da inflação). Estados Unidos e Europa ainda estão no processo de aperto. Europa entrou ainda um pouco depois. América Latina está na frente, depois Estados Unidos, depois Europa. Somos vistos como a região que combateu a inflação antes e sairá antes”.

Mas essa agilidade por favorecer mais a esses países em função dessa agilidade? Quis saber o jornalista.


“O que pode trazer mais recursos é a percepção de que a América Latina e o Caribe têm uma complementariedade com o que o mundo precisa hoje. Quando pensam ‘onde vamos investir em hidrogênio verde’? Tem que ser na América Latina. O mesmo com o lítio, o cobre e alimentos? Se houver essa percepção que a região vai se beneficiar dos próximos 10 ou 20 anos, aí o investimento vai vir”, disse.


E disse mais, “Para não perder a oportunidade, precisa investir em infraestrutura, ter projetos, ter as regras do jogo claras, estabilidade. É isso que precisa para maximizar essa atividade. Em vez de ser uma década perdida, como tantas foram, será uma década achada. Você vai achar nesta década a oportunidade para o futuro. E nas próximas”.

IIan Goldfajn informou que, “Há demandas sociais crescentes, populações impacientes por mudanças. Há mudanças políticas, de um governo para outro, protestos nas ruas, questões sociais. Toda semana há uma questão em algum dos países. O 1º ponto é que a sociedade quer mudança. Pobreza, desigualdade, questões ambientais estão incomodando. Ao mesmo tempo, e esse é o 2º aspecto, temos restrições de recursos. Não há o suficiente para tudo. O espaço fiscal é menor depois da pandemia. Vamos resolver ampliando os recursos, mas a América Latina e o Caribe não têm crescido. São as décadas perdidas. Há demandas crescentes, impaciência e problema fiscal”.

Com relação à guerra na Ucrânia e as disputas dos EUA com a China e os impactos no fluxo de recursos para o Brasil, Goldfajn asseverou que,


“Se a percepção é que vai substituir as commodities, substituir os alimentos que estão faltando, que as commodities vão estar em alta, isso vai trazer mais recursos ao longo do tempo”.


E quais seriam os impactos no BID a decisão dos Brics em financiar projetos globais? “Precisamos de recursos de todo o mundo. Mesmo se somarmos todos os bancos, a quantidade de empréstimos ficará nos bilhões. Mas precisamos de trilhões. A ideia é se juntar. Temos um grupo de bancos multilaterais que se reúne a cada seis meses para acompanhar e mobilizar mais recursos. É um trabalho não só complementar, mas necessário”, respondeu.

Quando questionado sobre redução de juros e custos de empréstimos em troca de projetos ambientais, Ilan Goldfajn destacou que, “Você pode pensar no nosso programa Amazônia para Sempre. Poderia, por exemplo, emitir bônus da Amazônia. Bônus temáticos ligados à queda do desmatamento”.

E por fim, o Waltenberg quis saber sobre as reformas no BIB pregadas ao assumir a presidência do banco. Para Goldfajn, “Estamos em processo de mudar a instituição. Temos uma estratégia institucional, de pessoas. A nossa ideia é mudar e deixar o BID focado em impacto, agilidade. As pessoas tem que concentrar não na quantidade de recursos que elas emprestam, mas o que eles geram. Vamos dar um incentivo para que quem pega empréstimo olhe o resultado, e não só fique feliz com o dinheiro”.

Redação Move Notícias