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Publicado em: 25 março 2024 às 08:35 | Atualizado em: 25 março 2024 às 08:37

Contra os que são contra o Piauí

Por Edmilson Sanches *

Serra da Capivara. Belezas e importância histórica, cultural, científica e socioeconômica do Piauí orgulham o Brasil – Fotos: Not1 e 1000dias

Há 13 anos, em 25 de março de 2011, o Estado do Piauí e os cidadãos piauienses foram vítimas de um ataque de ignorância verbal, deboche, preconceito e antibrasilidade. Um ator à toa de São Paulo, um desconhecido Marauê Carneiro, que se encontrava na capital piauiense naquela data, escreveu na rede social Facebook a seguinte frase: “Estamos em Teresina do Piauí, se é que o mundo tem cu, o cu do mundo é aqui!!”

Sob qualquer prisma que se veja, com quaisquer olhos que se leia, a frase é no mínimo deselegante para ser pronunciada ou escrita por quem está chegando a uma cidade, onde espera ser bem recebido e, como artista de teatro, espera ser bem visto. É uma infelicidade!

Teresina e o Piauí têm notáveis registros de valores históricos, turísticos, científicos, culturais, sociais e econômicos. A capital piauiense é considerada uma das melhores em termos de segurança e qualidade de vida. Por causa de sua arborização, recebeu do famoso escritor maranhense Coelho Netto o título de “Cidade Verde”.

É no Piauí que se encontra, no Parque Nacional de Sete Cidades, em Piracuruca, o primeiro centro intelectual dos povos tupis, também local de passagem dos povos fenícios. No Piauí estão mais de setecentos sítios arqueológicos, concentrados no Parque Nacional Serra da Capivara, onde estão as provas arqueológicas dos mais antigos humanos das Américas. De certa forma, não havendo contestações científicas posteriores, pode-se dizer que o Piauí é a matriz dos brasileiros e dos americanos em geral.

No mínimo e portanto, mais respeito com os mais velhos.

As reações ao tresloucamento verbal-proctológico do ator foram imediatas, culminando com cancelamento da peça que estava prevista para ser apresentada e reapresentada durante três dias na capital piauiense. A página do ator não era mais possível ser acessada no Facebook. Também não se podia ver a página de uma amiga dele, que de alguma forma apoiou seu comentário, a atriz Sthefany Brito, recém-descasada de rápida união com o jogador Pato e irmã de Kayky Brito, também ator da peça de que participa Marauê.

A confusão – ou o auê, não é, Marauê? – foi formada. O jovem ator pediu desculpas e declarou estar vivendo “o dia mais triste” de sua vida. A Polícia Civil registrou queixa e a delegada disse que o ator não sairia do estado sem antes prestar declarações formalmente. Policiais foram enviados para aeroporto para que o ator paulista não saísse sem “visitar” a delegacia.

É a velha sabedoria dos nossos pais e avós: “Cabeça que não pensa, corpo padece”. E não só o corpo: também o bolso, o sono, a tranquilidade…

Não é de hoje que o Piauí é alvo de ataques verbais desta maneira. Em 2005 e em 2007 duas outras frases infelizes foram estampadas na Imprensa, e uma delas provocou até o rompimento de sólidos e tradicionais laços empresariais. Nessa época escrevi o texto a seguir.

O contratorpedeiro “Piauí” e seu emblema naval militar – Foto: Reprodução

Mas, antes do texto, uma dessas curiosidades e coincidências que dá o que pensar: A agressão verbal contra o Piauí e seu povo foi feita pelo empresário Paulo Zottolo, nascido em 1956, à época presidente da Philips do Brasil. Zottolo, em um tempo de sua vida, havia trabalhado em um navio de guerra da Marinha Brasileira que tinha o nome de… Piauí. O navio, um contratorpedeiro, era o “CT Piauí (D-31)”, o terceiro até aquela época que homenageava o nome daquele estado nordestino.

O CT Piauí foi construído por estaleiro especializado, localizado próximo do porto de Nova York, nos Estados Unidos. Após ser utilizado em grandes conflitos, como a Segunda Guerra Mundial (1939/45) e a Guerra da Coreia (1950/53), o navio foi emprestado à Marinha do Brasil e incorporado em 1967. Seis anos depois, em 1973, o contratorpedeiro passou a integrar definitivamente a Armada Brasileira, a mais antiga das três Forças nacionais. Foi no navio contratorpedeiro “Piauí” que o oficial Paulo Alberto Zottolo embarcou e onde permaneceu por um ano (após dez anos de serviço na Marinha, deu baixa como segundo-tenente).

O muito de disciplina e deveres cívicos que Zottolo aprendeu no mar no “Piauí”… ele jogou por terra…

Veja o artigo que escrevi após…


UM COXO MENTAL

I – AS ORIGENS

Há muito tempo, no Nordeste da Itália, existiam os vênetos. A língua que eles falavam era uma variação do latim chamada “latim vulgar”.

Como se sabe, naqueles tempos costumava-se acrescentar ao nome da pessoa uma característica dela. Podia ser um termo relacionado ao aspecto físico, à profissão, à origem etc.

Àquela pessoa que tinha um defeito em uma das pernas, que claudicava, que era coxa, chamava-se, em língua vêneta, “zsoto” (pronuncia-se “zoto”).

“Zsoto” chegou ao italiano como “Zoppo” e “Zotto”, com o significado de “coxo”, “manco”, “capenga”, “claudicante”, “com defeito físico nas pernas”.

Se o coxo era um homem pequeno, acrescentava-se ao nome o sufixo diminutivo “-olo” (também com dois “ll”: “-ollo”).

É daí quem vem o sobrenome do atual [em 2007] presidente da multinacional Philips do Brasil — Paulo Zottolo.

“Zottolo”, portanto, significa, na origem, um “pequeno homem manco”, um “homenzinho coxo”, um “coxinho”.

Teria algo a ver com a origem vêneta o que deu na veneta do “chairman” da Philips?

II – O CARA

Foi esse bem-sucedido brasileiro, executivo de nomeada, engenheiro formado com o dinheiro do contribuinte pela Escola Naval, esse jovem de 51 anos [em 2007] com pós-graduação em Marketing pela Universidade de Nova York, esse administrador de saudáveis cargos e encargos à frente de empresas do naipe da Nívea, Natura, FMC e Tyco…

Pois bem, foi esse moço trabalhador e apreciador do resultado de seu trabalho (é midiático, “ousado”, polêmico, gosta de aparecer, ser celebridade), foi esse cabra que acaba de repetir um momento de deselegância, de ofensa, contra o estado do Piauí, contra o Brasil e contra a inteligência humana.

III – FREUD EXPLICA…

Em tempos de multiculturalidade, do não à intolerância, do sim à biodiversidade humana, em tempos de mais e mais respeito para com os outros, de paz na terra entre os seres de boa vontade, o que faz Paulo Zottolo? Talvez, inconsciente e involuntariamente (Freud explica…), Zottolo volta sua desajustada metralhadora verbal contra os piauienses. Como numa estratégia de guerra, ataca, primeiro, a capital, Teresina, para quem dedica a seguinte frase, dita à revista “IstoÉ Dinheiro”, edição de 19 de outubro de 2005, quando ainda era o presidente da Nívea:

“A Nivea aqui era como Teresina, capital do Piauí: todo mundo sabe que existe, mas poucos conhecem”.

Nívea é marca de produtos de suavidade, mas o seu à época presidente foi grosso, áspero, caraquento.

Continuando sua tática bélica, já atingida a capital, Zottolo quer abalar o restante do território piauiense. Assim, assume um avião bombardeiro e, do alto de sua irreflexão, solta uma bomba:

“Não se pode pensar que o país é um Piauí. Se o Piauí deixar de existir ninguém vai ficar chateado”.

IV – KAMIKAZE

Bem, enquanto ele tiver as ilhas da revista “Caras” e a de Comandatuba, seu Paulo Zottolo não precisa nem depende da imagem que lhe fazemos nós sem-dinheiro, embora consumidores dos produtos da empresa (a Philips) que ele por enquanto (por enquanto…) dirige.

Do jeito que a coisa está indo, deixa-se de acreditar que Paulo Zottolo seja um homem inteligente. Ao torpedear assim um Estado de seu próprio país, esse líder empresarial atira contra si, contra sua imagem e contra a imagem da(s) marca(s) que representa.

Seu Zottolo sabe que palavras têm poder. Ele sabe que desde o início era o verbo. Ele sabe o quanto um momento de alucinação verbal compromete.

Nos próximos meses e anos, o feito mais lembrado de Paulo Zottolo não serão o faturamento e o lucro, o desempenho econômico positivo que ele tenha agregado às empresas que dirigiu. Serão suas más palavras. Elas serão sua próxima e permanente medida. Nas entrevistas, nos perfis empresariais, nas referências a Zottolo, o jornalista fará referência às mancadas verbais contra os boas-gentes piauienses.

Um homem que trabalhou anos na Europa, que vai a outros países como quem vai normalmente ao trabalho do dia-a-dia, já deveria ter aprendido muita coisa com gentes de culturas mais velhas que a nossa.

Se não aprendeu, é hora de fazer regressão. Se os piauienses prezam (como todos nós) o nome, a imagem de seu Estado, cada um de nós zela pelo próprio nome. Desta forma, se algum dia alguém chamar o ainda (ainda…) presidente da Philips de pequeno coxo, de homenzinho manco, é porque isso já está no nome dele.

As “mancadas” do sr. Zottolo não deveriam ter saído das pernas.

Mas, pelo visto e lido, elas subiram à cabeça. Com suas frases infelizes, Paulo Zottolo, mesmo sadio, tornou às origens, voltou a ser um coxo.

Um coxo mental.

* Edmilson Sanches

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